Genius - Estrela    

Nas últimas décadas, temos assistido a uma crescente escalada de decisões políticas que, sob o pretexto de proteger certos grupos ou camadas da sociedade, acabaram se convertendo em instrumentos de controle da vida cotidiana das pessoas. Não se trata mais apenas de coibir abusos pontuais, ação que pode ser necessária para a convivência pacífica das pessoas, mas de transformar exceções em regra, convertendo a exceção em norma e, com isso, minando a liberdade de escolha, o discernimento familiar e a atividade econômica legítima.

🔍 Controle e censura travestidos de proteção

O perigo não é novo: desde a segunda metade da década de 1980 temos percebido um declínio constante da moral, dos bons costumes e da organização familiar, combinando sugestivamente e não coincidentemente com a ascenção vertiginosa de setores organizados e ideologicamente motivados, passando inclusive a ocupar espaços em órgãos reguladores e legislativos, setores estes especializados em distorcer pautas importantess sob o manto do bem-estar social. O caso da proibição da publicidade infantil de brinquedos no Brasil é um exemplo claro de como essa sanha regulatória gerou efeitos colaterais nefastos para a cultura, para a indústria e, sobretudo, para a infância.

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🎠 Brinquedos não são vilões: são ferramentas de desenvolvimento

A proibição de mostrar às crianças e aos pais as inúmeras opções de brinquedos está, atualmente, comparada a produtos nocivos, como bebidas alcoólicas ou cigarros. Isso é um desatino semântico e lógico: enquanto esses últimos têm comprovada relação direta com doenças graves e vícios, brinquedos representam, historicamente, ferramentas essenciais para o desenvolvimento cognitivo, afetivo, motor e social das crianças. Ao brincar, a criança experimenta o mundo, simula realidades, aprende papéis sociais, constrói narrativas e desenvolve sua autonomia.

A publicidade de brinquedos, em sua era áurea entre os anos 1970 e 1990, não apenas movimentava o mercado, gerando milhares de empregos e inovação tecnológica nacional, como também estimulava a imaginação e o diálogo intergeracional. Comerciais bem produzidos de Playmobil, Comandos em Ação, Pogobol, Barbie, Lego, Genius, entre tantos outros, não eram simples apelos ao consumo. Eram convites à brincadeira, à fantasia, à criatividade. Eram peças culturais.

📉 O declínio de um setor e a evasão de divisas

Com o avanço das restrições à publicidade infantil, particularmente após a nefasta Resolução 163 do Conanda em 2014, que passou a considerar abusiva toda publicidade direcionada a crianças, o mercado de brinquedos foi duramente afetado. Empresas nacionais foram desestimuladas a investir em desenvolvimento de produtos e marketing. As grandes lojas especializadas, que outrora ocupavam edifícios inteiros em centros comerciais (como as extintas Lojas Brink, PB Kids em seu auge e a RiHappy em sua forma original), foram gradualmente substituídas por prateleiras tímidas nos supermercados. O que era um mercado de sonhos e experiências presenciais transformou-se em uma sombra importadora e genérica, amplamente dependente de produtos asiáticos de baixa qualidade e baixo valor agregado.

O impacto disso extrapola o setor econômico. Gera desemprego qualificado, perda de know-how industrial e, principalmente, impede que novos empreendedores nacionais se lancem em um setor que, outrora, era fértil em inovação. Além disso, a ausência de marcas locais de peso resulta em evasão de divisas, pois as compras, tanto presenciais quanto digitais, acabam sendo realizadas em marketplaces globais.

Criança e celulares    

📱 Publicidade predatória real está nos celulares, não nos brinquedos

Paradoxalmente, no mesmo ambiente em que se proibiu a publicidade de brinquedos, o que temos hoje é uma geração de crianças com acesso irrestrito a celulares a partir dos 4 ou 5 anos de idade — e, por vezes, até mais cedo. Esses dispositivos expõem os pequenos a um ambiente digital altamente mercantilizado e perigosamente não monitorado. Ao contrário dos antigos comerciais de TV que passavam em horários e contextos específicos, os aplicativos e jogos em celulares frequentemente veiculam anúncios predatórios, com compras embutidas (in-app purchases), propagandas de jogos de azar, apostas esportivas (bets), e até conteúdos de conotação pornográfica. Tudo isso sem que os pais tenham qualquer controle efetivo ou mesmo consciência do que está sendo oferecido a seus filhos.

Ou seja, o verdadeiro risco à infância não está nos comerciais de bonecas e carrinhos cuidadosamente produzidos, mas na invisibilidade algorítmica das propagandas digitais. Não existe isso de "exposição excessiva" em celulares: celular é uma ferramenta EXCLUSIVA PARA ADULTOS, não é para uso de crianças, nem por 1 minuto.

    pequeno arquiteto

📢 Revogar as restrições: uma medida civilizatória e racional

É urgente e necessário revogar as restrições generalizadas à publicidade de produtos legítimos voltados ao público infantil. A liberdade de expressão comercial, quando praticada dentro de parâmetros éticos e sob regulação clara, é um dos pilares de uma economia saudável e de uma cultura plural. A propaganda de brinquedos não apenas cumpre papel mercadológico, mas também cultural, social e formativo. Não se trata de abandonar a proteção infantil, mas de restaurar o equilíbrio entre proteção e autonomia familiar.

Afinal, é o lar, e não o Estado, o espaço mais adequado para ensinar o discernimento, mediar desejos e orientar escolhas. Legislar como se brinquedo fosse substância tóxica é não apenas um erro conceitual, mas uma grave violência estatal contra a infância.

✅ Brincar é um direito, conhecer os brinquedos também

Permitir novamente que as crianças e seus pais tenham acesso a informações lúdicas e inspiradoras sobre brinquedos é reabilitar um direito cultural e emocional da infância. É também valorizar a indústria nacional, fomentar empregos criativos e devolver dignidade a um setor que nunca deveria ter sido comparado — nem em discurso — ao de produtos que causam dependência e morte.

É tempo de deixar que a imaginação volte à vitrine.

📚 Referências

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Para citar este artigo em ABNT:
SILVA FILHO, J∴ "🧸 Publicidade infantil não é o vilão". Old Bits, a mágica dos 8 bits. São Paulo. 2025. Disponível em: https://www.oldbits.com.br/editorial/91-a-urgencia-de-rever-a-politica-de-publicidade-infantil-no-brasil. Acesso em: 24 de jun. de 2025.
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SILVA FILHO, J∴ (2025, jun 11). 🧸 Publicidade infantil não é o vilão. Old Bits, a mágica dos 8 bits. Recuperado em junho 24, 2025, em https://www.oldbits.com.br/editorial/91-a-urgencia-de-rever-a-politica-de-publicidade-infantil-no-brasil.
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SILVA FILHO, J∴, 2025. 🧸 Publicidade infantil não é o vilão [online]. [visto em 24 de junho de 2025]. Disponível em https://www.oldbits.com.br/editorial/91-a-urgencia-de-rever-a-politica-de-publicidade-infantil-no-brasil.
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SILVA FILHO, J∴ "🧸 Publicidade infantil não é o vilão". Old Bits, a mágica dos 8 bits. Web. 24 jun, 2025.
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